A passagem do Novo Testamento que me levou a pensar no que escrevi nesta  reflexão foi aquela em que o Mestre curou o criado de um centurião  romano.
O texto é fantástico como tantos outros apresentados nos  evangelhos!
Mas dois versículos que sempre passam despercebidos  são centrais em todo o contexto daquele momento vivido pelo Senhor  Jesus.
Refiro-me aos versículos 11 e 12, nos quais Ele diz: “...  muitos virão do Oriente e do Ocidente e tomarão lugares à mesa com  Abraão, Isaque e Jacó no reino dos céus. Ao passo que os filhos do reino  serão lançados para fora, nas trevas; ali haverá choro e ranger de  dentes”.
Um fundamentalista imediatamente diria: claro, muitos  virão e se assentarão à mesa com os patriarcas se se converterem a Jesus  Cristo. Contudo há uma observação simples para ser feita. O Mestre não  diz que muitos virão e se converterão; Ele apenas diz que muitos virão e  tomarão lugares.
Mais simples ainda fica essa leitura, quando se  observa com cuidado a importância do centurião nessa história. Ele é a  chave de tudo e a sua fé é o ponto de partida.
É importante  lembrar que o centurião não era nem judeu nem discípulo de Jesus, logo  não era membro do Judaísmo, muito menos do Cristianismo que ainda nem  existia. Possivelmente, aquele centurião, como todo bom e autêntico  soldado romano, era adorador de vários deuses e provavelmente do  imperador romano. Numa linguagem cristã, ele era pagão, numa linguagem  mais coerente, ele era um religioso politeísta.
Há ainda a  hipótese de que nem religioso politeísta ele era, mas apenas um homem  que de judeu e de seguidor de Jesus não tinha nada.
Uma segunda  observação: ele não se torna cristão após a cura de seu criado. O texto  nem relata isso, pois se ele tivesse se convertido, certamente estaria  relatado. Mas não, ele permanece na condição (a) religiosa em que se  encontrava quando foi procurar ao Mestre.
Portanto, o que um  texto deste, se lido a olho nu, sem as lentes da religião cristã, sem os  óculos da teologia sistemática ortodoxa e sem os pré-conceitos do  fundamentalismo, poderá significar a não ser que Jesus Cristo é o  Caminho, a religião – e aqui entra o Cristianismo também – o desvio, e a  Graça o meio através do qual Deus salva o ser humano, seja ele alguém  que se converterá em algum momento ao Evangelho ou não?
Neste  sentido, não dá mais para afirmar que um ser humano que passa a sua vida  inteira sem freqüentar uma “igreja de crentes”, irá para o inferno só  porque não teve tal experiência. Graças a Deus, em muitos casos, pois há  pessoas que quando resolvem freqüentar uma denominação evangélica se  tornam loucas, manipuladas, bitoladas, cegas espiritualmente, enganadas,  alienadas, bestializadas, e tudo o que for possível entrar nesta lista,  menos alguém que de fato conheceu e compreendeu o Evangelho da Graça.
Com  isso, quando muitos se convertem às “igrejas de crentes”, acreditam que  estão no Caminho, quando na verdade estão no desvio. Têm uma facilidade  enorme para apontar quem vai e quem não vai para o Céu, contudo, não se  percebem como pessoas que carecem da Graça de Deus ainda mais, pelo  simples fato de serem pessoas que não sabem fazer outra coisa, a não ser  julgar o próximo.
Nisto creio e afirmo com todas as letras:  Cristo é o Caminho, pois é capaz de salvar e ver fé genuína em um  centurião romano, adorador de deuses estranhos, pagão e adorador do  imperador, mas o Cristianismo é o desvio, pois consegue maquiar-se com  as belezas sublimes do Evangelho, mas vive uma religião semelhante à dos  fariseus dos tempos de Jesus, que eram zelosos e ortodoxos no que se  refere à obediência ao texto, mas cegos na prática, sobretudo, por  julgarem com facilidade, seres humanos que eram tão imperfeitos quanto  eles.
Cristo é o Caminho, o Cristianismo é o desvio, pois este  pratica as maiores e mais terríveis atrocidades em nome de Deus; Cristo é  o Caminho, o Cristianismo é o desvio, pois este ensina as pessoas, a  ingênua e inocentemente negociarem com Deus a fim de conseguirem  prosperidade financeira, como se Ele tivesse interesse em enriquecer  materialmente os seus filhos; Cristo é o Caminho, o Cristianismo é o  desvio, pois burra e admiravelmente se tornou a religião que menos  entendeu os ensinamentos de seu próprio fundador – se é que Jesus foi o  fundador desse negócio – ; Cristo é o Caminho, o Cristianismo é o  desvio, pois consegue levar as pessoas a acreditarem que os não-cristãos  irão para o inferno só porque não se tornaram cristãos, como se Deus só  pudesse salvar pessoas por meio de experiências religiosas dentro das  “paredes” da religião cristã; Cristo é o Caminho, o Cristianismo é o  desvio, pois este em vez de tornar a caminhada cristã uma caminhada de  liberdade e descanso, torna-a ainda mais penosa, turbulenta, repleta de  regras e cargas a serem carregadas; Cristo é o Caminho, o Cristianismo é  o desvio, pois em vez de manter as pessoas que acreditam estarem  servindo ao Jesus apresentado nos evangelhos, consegue desviá-las a  qualquer outro caminho que não é o Caminho da Graça de Deus em Cristo.
Cristo  é o Caminho, o Cristianismo é o desvio, por tantos outros e infindáveis  motivos! Cabe agora a criatividade de cada um para continuar nesta  reflexão, se é que para enxergar as discrepâncias existentes entre  Cristo e o Cristianismo, seja uma tarefa que exija muita criatividade.  Penso que não.
na Graça,
Jefferson  Ramalho